Relatório destacou que quase 1 em cada 3 mortes por câncer de pele não melanoma é causada pela radiação ultravioleta do trabalho ao ar livre
Trabalhar exposto ao sol pode ser uma das principais causas do câncer de pele em todo o mundo, de acordo com novos dados da Organização Mundial da Saúde e da Organização Internacional do Trabalho.
As duas agências das Nações Unidas anunciaram em conjunto novas estimativas na quarta-feira (8) que associam o trabalho ao ar livre sob a luz solar ao câncer de pele não melanoma. O relatório, publicado na revista de pesquisa Environment International, afirma que quase 1 em cada 3 mortes por câncer de pele não melanoma é causada pela radiação ultravioleta do trabalho ao ar livre.
Os novos dados classificariam a exposição ocupacional à radiação ultravioleta – realizar tarefas de trabalho ao ar livre, no sol – como o terceiro maior agente cancerígeno ocupacional, atrás apenas do amianto e do pó de sílica.
“É realmente importante, porque são as primeiras estimativas de câncer de pele relacionado com o trabalho que temos a nível mundial”, disse Frank Pega, epidemiologista da OMS e principal autor do estudo. “[A radiação solar] é um conhecido agente cancerígeno ocupacional”.
“Câncer de pele não melanoma” refere-se a um grupo de cânceres que se desenvolvem nas camadas superiores da pele, para além das células dos melanócitos que produzem o pigmento da pele. Inclui cânceres como carcinoma basocelular e carcinoma espinocelular.
A radiação ultravioleta da luz solar é um fator de risco conhecido para câncer de pele: de acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, a radiação solar pode danificar as células da pele e, com o tempo, causar câncer de pele.
Como resultado, a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer da OMS reconhece a radiação solar como um agente cancerígeno do Grupo 1, algo que é conhecido por causar câncer em humanos.
De acordo com Pega, foram necessários sete anos para reunir dados abrangentes suficientes para emitir as novas estimativas.
Os pesquisadores examinaram casos de exposição à radiação solar no local de trabalho e casos de câncer de pele não melanoma em quase 200 países. O relatório reuniu 763 inquéritos à força de trabalho para analisar 166 milhões de observações em 2000, 2010 e 2019, tornando este um dos maiores estudos sobre a luz solar e o câncer no local de trabalho, disse Pega.
“Para produzir essas estimativas, o nível de evidência é muito alto”, acrescentou. “As evidências precisam ser muito fortes para que possamos considerar prosseguir”.
O relatório concluiu que, em 2019, 1,6 mil milhões de trabalhadores estavam expostos profissionalmente à radiação ultravioleta: quase 30% de todas as pessoas em idade ativa, muitas vezes em indústrias como a agricultura, a construção e a pesca. Os homens e os adultos jovens foram os mais expostos, mas, no geral, o número total de pessoas expostas à radiação ultravioleta no trabalho caiu 32% entre 2000 e 2019.
Apesar desse declínio, o número de mortes por câncer de pele associadas à radiação UV ocupacional aumentou cerca de 90% durante o mesmo período, descobriram os pesquisadores. A exposição à radiação UV no local de trabalho causou 18.960 mortes por câncer de pele não melanoma em 2019, a maioria das quais eram homens.
“A exposição ocupacional à [radiação UV] é comum e causa uma carga atribuível substancial, injusta e crescente [de câncer de pele não melanoma]”, afirma o estudo.
Muitos dos trabalhadores expostos à radiação solar, acrescentou Pega, também trabalham na economia informal, sem empregador, obtendo rendimentos através da coleta de materiais recicláveis ou trabalhando em mercados ao ar livre. As pessoas que trabalham perto de superfícies refletoras, como os pescadores rodeados de água, também correm um risco aumentado de câncer de pele porque sofrem uma radiação mais intensa.
Estimativas anteriores da OMS descobriram que a exposição ocupacional à radiação UV aumenta as probabilidades de desenvolver câncer de pele não melanoma em 60%. De acordo com Pega, porém, a equipe de pesquisa não tinha dados de alta qualidade suficientes para fazer determinações semelhantes sobre melanomas.
Globalmente, disse Pega, o câncer de pele está normalmente concentrado em áreas como Europa, América do Norte e Austrália. Mas nos novos dados, o câncer de pele do trabalho era mais provável do que se esperava em países com renda baixa e média, particularmente em partes da África.
“O câncer da pele concentra-se normalmente nos países com renda elevada do norte global”, explicou. “É surpreendente, porque nunca poderíamos esperar isso”.
Os riscos da exposição solar no local de trabalho, no entanto, não são inevitáveis, disse Pega. Os empregadores e os decisores políticos podem tomar medidas para reduzir o risco dos trabalhadores serem expostos à radiação UV. Por exemplo, os empregadores podem mudar o horário dos trabalhadores ao ar livre, evitando o pico de luz solar por volta do meio-dia.
Os empregadores também poderiam tomar medidas para proporcionar sombra aos trabalhadores ao ar livre, e as leis do trabalho poderiam incluir requisitos para vestuário de proteção, como chapéus de abas largas e camisas de manga comprida. Protetor solar também seria bom, disse Pega.
A nível médico, Pega apelou pela melhoria do acesso ao rastreio precoce do câncer da pele, para que a doença possa ser detectada e tratada rapidamente. As intervenções médicas são particularmente importantes para os trabalhadores nas economias informais, disse ele, uma vez que os trabalhadores informais ao ar livre muitas vezes trabalham sem empregador e fora do alcance das leis laborais.
E, como último passo, os países poderiam começar a incluir o câncer da pele causado pela exposição ocupacional à luz solar nas listas nacionais de doenças laborais, o que poderia abrir a porta para os trabalhadores afetados receberem indenizações trabalhistas, acrescentou Pega.
“É uma verdadeira mudança de pensamento”, disse ele. “Os sistemas de saúde ocupacional terão realmente que se adaptar”.
Link de referência da matéria: https://www.cnnbrasil.com.br
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