A doença pulmonar obstrutiva crônica é caracterizada pelo estreitamento persistente das vias aéreas, podendo levar à dificuldade para respirar, falta de ar e cansaço
A publicitária Carla Comini, 61, fumou seu primeiro cigarro aos 13 anos, mas o tabagismo se tornou constante na sua vida a partir dos 18. Ao longo do tempo, seu pai chegou a oferecer presentes para que ela parasse de fumar. “Eu sou do tempo que fumar era um glamour. Não existia, na minha cabeça, essa ideia de que fumar causa câncer”, relata, em entrevista à CNN. Foi só aos 49 anos que ela decidiu parar de fumar.
Apesar da decisão — que foi acompanhada de apoio psicológico e psiquiatra –, os efeitos do cigarro no seu organismo já se tornavam evidentes. A tosse era constante no seu dia a dia, principalmente diante de mudanças no tempo. “Eu banalizava esses sintomas, vivia muito no automático”. Até que sua irmã foi diagnosticada com câncer de pulmão e isso acendeu um alerta em sua mente.
“Eu pensei: ‘se minha irmã, que fumou por menos tempo do que eu, tem câncer, imagine eu'”, conta. Foi, então, atrás de um médico e descobriu que, felizmente, não tinha o tumor. Mas tinha enfisema pulmonar, um tipo de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) cujo principal fator de risco é o tabagismo.
A DPOC é caracterizada pelo estreitamento persistente das vias aéreas, o que pode ocorrer na forma de enfisema ou de bronquite obstrutiva crônica — ou, em alguns casos, com ambos os distúrbios. Esse estreitamento torna o fluxo de ar restrito nos pulmões, podendo levar à dificuldade para respirar, falta de ar, chiado no peito, cansaço e tosse, que pode vir com catarro ou não.
“Em geral, 80% dos casos de DPOC estão relacionados ao cigarro atualmente, mas exposição à fumaça de lenha e a altos níveis de poluição também podem causar a doença”, explica José Eduardo Cançado, professor de Pneumologia na Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, à CNN.
No Brasil, estima-se que 7 milhões de pessoas sofram com a doença e somente 12% dos casos são diagnosticados, segundo a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT). De janeiro a abril de 2023, 2.589 pessoas morreram por DPOC, de acordo com o DataSUS.
Tipos de DPOC e como diagnosticar
A DPOC pode se manifestar de duas formas diferentes ou, em alguns casos, combinadas. São elas:
Bronquite crônica: definida como tosse com catarro que dura, pelo menos, três meses, durante dois anos. Quando ocorre obstrução do fluxo aéreo, é caracterizada como bronquite obstrutiva crônica;
Enfisema: definida como danos irreversíveis das paredes que sustentam os alvéolos, estruturas que compõem o pulmão.
“Cada paciente pode ter características diferentes da doença. Tem indivíduo que tem DPOC que tem muito mais tosse e catarro, e tem outro que pode não ter tosse, mas ter muita falta de ar”, explica Cançado. “O grande problema é que a maioria dos pacientes com DPOC tem tanto bronquite crônica, quanto enfisema”, completa.
A diferenciação entre os dois tipos de DPOC é feita por meio do diagnóstico. Além da avaliação médica dos sinais e sintomas, além do histórico de saúde, alguns testes podem ser realizados para diagnosticar a doença. São eles:
Testes de função pulmonar: medem a quantidade de ar que o paciente consegue inspirar e expirar, e se os pulmões fornecem oxigênio suficiente para seu sangue;
Raio X de tórax: pode identificar enfisema, além de descartar outras condições pulmonares ou insuficiência cardíaca;
Tomografia computadorizada: pode identificar enfisema e determinar a necessidade de cirurgia;
Análise de fases no sangue arterial: mede quão bem os pulmões estão trazendo oxigênio para o sangue e removendo dióxido de carbono;
Exames laboratoriais: podem ser usados para determinar a causa dos sintomas e descartar outras condições de saúde.
Porém, Cançado alerta para o subdiagnóstico da doença. “Os sintomas iniciais da doença são semelhantes ao de um resfriado ou gripe e, então, o paciente vai para o pronto-socorro e, muitas vezes, recebe um xarope ou antibiótico. Ele melhora por um tempo, continua a fumar e não é feito o diagnóstico da DPOC e o tratamento adequado”, afirma o especialista.
“Em geral, o paciente recebe o tratamento quando ele já tem um quadro avançado de perda de capacidade pulmonar e, muitas vezes, já é tarde para recuperar ou minimizar o impacto da doença”, completa.
DPOC não tem cura, mas tem tratamento
A DPOC não tem cura, mas tem tratamento, o que inclui medicamentos broncodilatadores — que dilatam os brônquios e facilitam o fluxo de ar nas vias aéreas –, terapia de oxigênio, em casos graves, e a reabilitação pulmonar, voltada para a prática de exercícios respiratórios que melhoram a respiração e a capacidade do paciente de praticar atividades físicas gerais.
Os medicamentos broncodilatadores inaláveis são as conhecidas “bombinhas“. Eles agem relaxando os músculos ao redor das vias aéreas, aliviando a tosse e a falta de ar. Existem dois tipos: os de curta ação, que começam a funcionar em segundos e podem durar de 4 a 6 horas, e os de ação prolongada, que demoram mais para começar a fazer efeito, mas é duradouro.
Dependendo da gravidade da doença, pode ser necessária a combinação de broncodilatadores e corticoides inalatórios, que são usados juntos em uma mesma bombinha. Em alguns casos, também pode ser indicado o uso de medicamentos corticosteroides orais, que ajudam a prevenir o agravamento da DPOC.
Recentemente, uma nova terapia tripla inalatória para o DPOC foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), combinando dois broncodilatadores de longa ação com corticosteroide anti-inflamatório inalatório em uma mesma bombinha. Em ensaios clínicos randomizados, a nova terapia, da biofarmacêutica AstraZeneca, apresentou o potencial de reduzir 52% das crises relacionadas à DPOC.
Porém, uma das medidas mais importantes do tratamento é parar de fumar. “Quando o paciente consegue parar de fumar, a velocidade de progressão da doença diminui. A pessoa não vai recuperar sua capacidade pulmonar, mas vale a pena parar de fumar”, orienta Cançado.
Além disso, manter a vacinação em dia é uma medida fundamental para reduzir o risco de infecções em pacientes com DPOC. “Cada vez que o paciente tem uma crise, ela inflama mais os brônquios, a função pulmonar decai e a doença progride. Então, prevenir infecções ajuda a prevenir crises e exacerbações da doença”, explica o especialista.
Reabilitação pulmonar melhora qualidade da respiração
A reabilitação pulmonar é um importante tratamento não farmacológico da DPOC, pois ajuda a melhorar a qualidade de vida e a respiração do paciente. Os programas de reabilitação pulmonar costumam incluir exercícios respiratórios, aconselhamento nutricional e apoio psicológico.
De acordo com a Mayo Clinic, organização sem fins lucrativos da área de serviços médicos e de pesquisas médico-hospitalares de referência nos Estados Unidos, a reabilitação pulmonar pode reduzir a admissão no hospital, aumentar a capacidade de realizar atividades cotidianas e melhorar a qualidade de vida do paciente com DPOC.
Desde que foi diagnosticada, Carla realiza exercícios respiratórios e, durante a pandemia de Covid-19, foi o que a ajudou a superar a infecção pelo coronavírus. “Eu peguei Covid e tive 35% do meu pulmão comprometido. Eu não fui internada graças ao apoio que tive de médicos e graças ao exercício respiratório”, relata. “Hoje em dia eu pratico yoga, que eu acredito que é uma atividade fundamental para o equilíbrio respiratório e físico”, conta.
Com a prática de atividade física e a reabilitação pulmonar, Carla consegue ter uma boa qualidade de vida mesmo com DPOC. “Eu gosto de viajar e quando eu viajo, eu ando muito. Graças à preparação física, que não é muita, mas inclui esses exercícios respiratórios, eu consigo fazer minhas viagens”, finaliza.
Link de referência da matéria: https://www.cnnbrasil.com.br
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